terça-feira, 29 de setembro de 2009

Introdução


O romance Menino de Engenho é uma das obras da Literatura Brasileira mais significativa, principalmente entre as que tratam de assuntos relacionados á realidade Nordestina, na época dos engenhos e da escravidão.
A historia é interessante e sentimental em certos aspectos.Ela descreve com emoção e de forma direta uma sociedade rural, latifundiária e escravocrata.
Alguns elementos como as crenças populares e as características da região onde a historia se passa, aproximam o romance fictício da realidade, tornando a leitura mais cativante. É uma obra trabalhada intelectualmente e feita para ser analisada, não é um passatempo, mas um documento de análise.

Biografia do autor


“Tenho quarenta e seis anos, moreno, cabelos pretos, com meia dúzia de fios brancos, um metro e 74 centímetros, casado, com três filhos e um genro, 86 quilos bem pesados, muita saúde e muito medo de morrer. Não gosto de trabalhar, não fumo, não durmo com muitos sonos, e já escrevi 11 romances. Se chove, tenho saudades do sol, se faz calor tenho saudades da chuva. Sou homem de paixões violentas. Temo os poderes de Deus, e fui devoto de Nossa Senhora da Conceição. Enfim, literato da cabeça aos pés, amigo de meus amigos e capaz de tudo se me pisarem nos calos. Perco então a cabeça e fico ridículo. Não sou mau pagador. Se tenho, pago, mas se não tenho, não pago, e não perco o sono por isso. Afinal de contas, sou um homem como os outros. E Deus queira que assim continue.”






José Lins do Rego, jornalista, romancista, cronista e memorialista, nasceu no Engenho Corredor, Pilar, PB, em 3 de julho de 1901, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 12 de setembro de 1957. Eleito em 15 de setembro de 1955 para a Cadeira n. 25, na sucessão de Ataulfo de Paiva, foi recebido em 15 de dezembro de 1956, pelo acadêmico Austregésilo de Athayde.

Filho de João do Rego Cavalcanti e de Amélia Lins Cavalcanti, fez as primeiras letras no Colégio de Itabaiana, PB, no Instituto N. S. do Carmo e no Colégio Diocesano Pio X de João Pessoa. Depois estudou no Colégio Carneiro Leão e Osvaldo Cruz, em Recife. Desde esse tempo revelaram-se seus pendores literários. É de 1916, por exemplo, o primeiro contato com O Ateneu, de Raul Pompéia. Em 1918, aos 17 anos portanto, José Lins travou conhecimento com Machado de Assis, através do Dom Casmurro. Desde a infância, já trazia consigo outras raízes, do sangue e da terra, que vinham de seus pais, passando de geração em geração por outros homens e mulheres sempre ligados ao mundo rural do Nordeste açucareiro, às senzalas e aos negros rebanhos humanos que a escravidão foi formando.
Passou a colaborar no Jornal do Recife. Em 1922 fundou o semanário Dom Casmurro. Formou-se em 1923 na Faculdade de Direito do Recife. Durante o curso, ampliou seus contatos com o meio literário pernambucano, tornando-se amigo de José Américo de Almeida, Osório Borba, Luís Delgado, Aníbal Fernandes, e outros. Gilberto Freyre, voltando em 1923 de uma longa temporada de estudos universitários nos Estados Unidos, marcou uma nova fase de influências no espírito de José Lins, através das idéias novas sobre a formação social brasileira.
Ingressou no Ministério Público como promotor em Manhuçu, MG, em 1925, onde entretanto não se demorou. Casado em 1824 com d. Filomena (Naná) Masa Lins do Rego, transferiu-se em 1926 para a capital de Alagoas, onde passou a exercer as funções de fiscal de bancos, até 1930, e fiscal de consumo, de 1931 a 1935. Em Maceió, tornou-se colaborador do Jornal de Alagoas e passou a fazer parte do grupo de Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz, Aurélio Buarque de Holanda, Jorge de Lima, Valdemar Cavalcanti, Aloísio Branco, Carlos Paurílio e outros. Ali publicou o seu primeiro livro, Menino de engenho (1932), chave de uma obra que se revelou de importância fundamental na história do moderno romance brasileiro. Além das opiniões elogiosas da crítica, sobretudo de João Ribeiro, o livro mereceu o Prêmio da Fundação Graça Aranha. Em 1933, publicou Doidinho, o segundo livro do "Ciclo da Cana-de-Açúcar".
Em 1935, já nomeado fiscal do imposto de consumo, José Lins do Rego transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde passou a residir. Integrando-se plenamente no ambiente carioca, continuou a fazer jornalismo, colaborando em vários jornais com crônicas diárias. Foi secretário geral da Confederação Brasileira de Desportos de 1942 a 1954. Revelou-se, então, por essa época, a faceta esportiva de sua personalidade, sofrendo e vivendo as paixões desencadeadas pelo futebol, o esporte de sua predileção.
Romancista da decadência dos senhores de engenho, sua obra baseia-se quase toda em memórias e reminiscências. Seus romances levantam todo um sistema econômico de origem patriarcal, com o trabalho semi-escravo do eito, ao lado de outro aspecto importante da vida nordestina, ou seja, o cangaço e o misticismo. O autor destacou como desejaria que a sua obra romanesca fosse dividida: Ciclo da cana-de-açúcar: Menino de engenho, Doidinho, Bangüê, Fogo morto e Usina; Ciclo da cangaço, misticismo e seca: Pedra Bonita e Cangaceiros; Obras independentes: a) com ligações nos dois ciclos: Moleque Ricardo, Pureza, Riacho Doce; b) desligadas dos ciclos: Água-mãe e Eurídice.
Prêmios recebidos: Prêmio da Fundação Graça Aranha, pelo romance Menino de engenho (1932); Prêmio Felipe d’Oliveira, pelo romance Água-mãe (1941), e Prêmio Fábio Prado, pelo romance Eurídice (1947).





sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Bibliografia do Autor


 ROMANCE: Menino de engenho (1932); Doidinho (1933); Bangüê (1934); O moleque Ricardo (1935); Usina (1936); Pureza (1937); Pedra Bonita (1938); Riacho Doce (1939); Água-mãe (1941); Fogo morto (1943); Eurídice (1947); Cangaceiros (1953); Romances reunidos e ilustrados, 5 vols. (1980).
MEMÓRIAS: Meus verdes anos (1956).
LITERATURA INFANTIL: Histórias da velha Totônia (1936).
CRÔNICA: Gordos e magros (1942); Poesia e vida (1945); Homens, seres e coisas (1952); A casa e o homem (1954); Presença do Nordeste na literatura brasileira (1957); O vulcão e a fonte (1958).
VIAGEM: Bota de sete léguas (1951); Roteiro de Israel (1955); Gregos e troianos (1957).
FILMES: Pureza, direção de Chianca de Garcia (1940); Menino de engenho, direção de Valter Lima (1965); Fogo morto, direção de Marcos Farias (1976).


Romances de José Lins do Rego foram traduzidos na Alemanha, Argentina, Espanha, Estados Unidos, França, Inglaterra, Itália, Portugal e Coréia.

Análise Literária


Narrado em 1ª pessoa por Carlos Melo (personagem), que aponta suas tensões sociais envolvidas em um ambiente de tristeza e decadência, é o primeiro livro do ciclo da cana-de-açúcar. Publicado em 1932, Menino do Engenho é a estréia em romance de José Lins do Rego e já traz os valores que o consagraram na Literatura Brasileira.Durante a década de 30 do século XX, virou moda uma produção que se preocupava em apresentar a realidade nordestina e os seus problemas, numa linguagem nova, introduzida pelos participantes da Semana de Arte Moderna de 22. José Lins do Rego seria o melhor representante dessa vertente, se certas qualidades suas não atenuassem fortemente o tom crítico esperado na época.


A intenção do autor ao elaborar a obra Menino de Engenho, era escrever a biografia de seu avô, o coronel José Paulino, que considerava uma figura das mais representativas da realidade patriarcal nordestina. Seria também a autobiografia das cenas de sua infância, que ainda estavam marcadas em sua mente. Mas o que se constata é que o biógrafo foi superado pela imaginação criadora do romancista: a realidade bruta é recriada através da criatividade do gênero nordestino.

Resumo

Menino de Engenho conta a história de Carlos, um menino órfão, que aos quatro anos de idade perde a mãe assassinada pelo pai, devido a uma loucura incontrolável. Mediante esta situação, Carlinhos é levado pelo tio Juca ao engenho do avô materno José Paulino – o Santa Rosa.


No engenho, Carlos conhece tia Maria, moça de coração bom, generosa e atenciosa que procura suprir com amor a ausência da mãe de Carlos. Além de tia Maria, ele conhece também a tia Sinhazinha, uma mulher velha, com aproximadamente sessenta anos e que implicava com tudo. Todos os empregados da casa tinham que cumprir suas ordens e respeitar suas crueldades.


Longe dos olhos de tia Maria e na companhia dos primos, carlinhos conhece um mundo cheio de aventuras, desigualdades sociais vividas pelos empregados do engenho, promiscuidade e desrespeito sexual. E foi neste ambiente desprovido de cuidados e atenção, que carlinhos começa muito cedo sua vida amorosa, se apaixonando pela sua primeira professora, que logo foi substituída pelas primas.
 

Fascinado com a liberdade da vida que gozava no engenho, Carlos se encanta com as mulatas, filhas dos empregados do avô. Com elas aflora para uma vida sexual precoce e aos doze anos de idade, contrai gálico de uma delas, tornando-se o assunto da região. Totalmente sem limites e sem educação, Carlos preocupa seu avô, que não encontra outro caminho a não ser encaminhá-lo para um colégio – o lugar o qual o tornaria um verdadeiro homem.

Narrador & ponto de vista


O romance possui narrador-personagem, pois ele participa da história, mas relata demonstrando as próprias impressões sobre ela.
O ponto de vista do autor é a favor, pois em vários momentos da historia ele utiliza argumentos para justificar as atitudes incorretas de alguns personagens.

Linguagem

A linguagem da obra é regionalista e popular, ou seja, a linguagem própria do local que se situa a história, neste caso, o Nordeste.
Abaixo, alguns termos regionalistas usados:


Acoitoabrigo, acolho, recebo, dou guarida, dou coito.
Aperreiosdificuldades, submissões, aperturas: aperreiação, apoquentação.
Bexiga-doidaespécie de varíola.
Bilhetes de sisaimposto de transmissão, imposto sobre compras e vendas.
Bimbinhas pênis de criança, coxas pequenas (de bimba).
Bodoquearco para atirar bolas de barro endurecidas ao fogo, pedrinhas, etc. Também estilingue, atiradeira.
Botijavaso de boca estreita, gargalo curto, pequena asa. Espécie de moringa.
Bueirochaminé de engenho ou usina.
Cabroeiraos cabras.
Cacimbas poços.
Camumbembe vadio, plebe, matuto morador de engenho.
Doença-do-mundo blenorragia, gonorréia.
Enganjentasorgulhosas, vaidosas.
Gálico doença venérea (a que pode deixar sífilis), blenorragia: estar engalicado.
Jerimunsabóboras
Latomia choro alto, lamúrias.
Mezinhas remédios caseiros.
Obrando defecando.
Papa-figobicho- papão.
Quengameretriz da pior espécie, vagabunda.
Repasto refeição.
Rolinhapênis de criança.
Sezãofebre intermitente.
Taboca bambu.
Tapurusos bichos que comem as frutas.
Varandaguarnição de renda das redes.
Xeireiroadulador, pateta.


Discurso

Indireto-livre, pois o narrador pode, não apenas reproduzir indiretamente falas da personagens, mas também o que elas não falam, mas pensam, sonham, desejam, etc.

Exemplo: Quando o narrador fala da melancolia e da angústia, sentida por Carlinhos.

Personagens


Carlinhos - É o narrador do romance. Órfão aos quatro anos, tornou-se um menino melancólico, solitário e bastante introspectivo. De sexualidade exacerbada, mantém, aos doze anos, a sua primeira relação sexual, contraindo “doença-do-mundo” - a popular gonorréia.


Coronel Zé Paulino - É o todo-poderoso senhor de engenho - o patriarca absoluto da região. Era uma espécie de prefeito - administrava pessoalmente, dando ordens e fazendo a justiça que ditava a sua consciência de homem bom e generoso.


Tia Maria - Irmã da mãe de Carlinhos (Clarisse), torna-se para este a sua segunda mãe. Querida e estimada por todos pela sua bondade e simpatia, era chamada carinhosamente de Maria Menina.


Velha Totonha - É uma figura admirável e fabulosa. Representa bem o folclore ambulante dos contadores de histórias.


Antônio Silvino - Representa bem o cangaceiro sempre temido e respeitado pelo povo, em virtude de seu senso de justiça, tirando dos ricos e protegendo os fracos. Compõe bem a paisagem nordestina.


Tio Juca - Não chega a representar um papel de destaque no romance. Por ser filho do senhor de engenho, fazia e desfazia (sobretudo sexo com as mulatas), mas não era punido. De certa forma, representa o papel de pai de Carlinhos.


Lula de Holanda - Embora ocupe pouco espaço, o Coronel Lula é uma personagem relevante, pois representa o senhor de engenho decadente que teima em manter a fachada aristocrática.


Sinhazinha - Embora não fosse a dona da casa (era cunhada do Coronel), mandava e desmandava no governo da casa-grande. Era odiada por todos por seu rigor e carranquice, e pode ser identificada com as madrastas ruins dos contos populares.


Negras - Restos do tempo de escravidão, destacam-se a negra Generosa, dona da cozinha, a vovó Galdina, que vivia entrevada numa cama.

Tempo


Cronológico.Uma das evidências disso é que o narrador (Carlinhos), tem quatro anos de idade quando a narrativa começa, e doze quando termina o livro, sem retorno ao passado durante a história.

Enredo


O romance possui enredo linear, sem cortes no tempo, acompanhando a ordem cronológica dos fatos. O tempo, o espaço, os personagens são apresentados de maneira lógica, as ações desenvolvem-se cronologicamente, observando-se o começo, o meio e o fim da narrativa.

Universal ou Regional?

Regional, com elementos próprios da região Nordestina, onde se passa a historia. Tais elementos estão presentes principalmente na descrição dos lugares e dos personagens.

Temporal ou Atemporal?

Temporal. Pois a historia da obra se passa em um engenho de açúcar, na época da escravidão, sendo vista hoje em dia como uma obra literária com elementos da historia da sociedade rural brasileira.

Pontos Clímax

  • A trágica morte de Clarisse, mãe de Carlinhos.
  • Quando ele chegou ao engenho e ficou maravilhado com o lugar que era tão imaginado e idealizado por ele.
  • Quando ocorreu a cheia do Paraíba, a enchente devastadora que matou pessoas e animais, e destruiu plantações e casas.
  • A partida da prima Maria Clara, por quem Carlinhos se apaixonou.
  • A partida iminente do menino para o colégio.

Cenário

O romance se passa na Zona da Mata nordestina, especificamente no engenho Santa Rosa, do coronel José Paulino.
É no engenho que acontecem praticamente todos os fatos marcantes do romance.
Dentro desse espaço do engenho encontramos outros ambientes como a senzala, a casa-grande, a cachoeira, o engenho Santa Fé, do coronel Lula de Holanda.

Desfecho

Após ter apanhado a doença do mundo, a qual ia operando nele uma transformação, o menino de calça curta ia ficando na curva do tempo e dali, precocemente, ia brotando um rapazinho de sexualidade aflorada. Recorreram ao colégio como uma casa de correção.
O trem levando o menino de seu engenho, para o colégio. O trem correndo e, pela janela, o menino vendo o gado, o campo, casa-grandes. E os molequinhos, à beira da estrada, acompanhando os vagões.

"Adeus, adeus, adeus, com as mãos para mim. E eu com o braço, sucudindo. Os olhos se encheram de lágrimas. Cortava-me a alma a saudade do meu engenho."

Contextualização

O contexto histórico deste livro é o Brasil colônia e seu regime escravocrata. A localização geográfica se dá no nordeste brasileiro, nos solos de massapê (argiloso) da zona da mata no Estado da Paraíba. As relações sociais vividas na época são o ponto alto do livro, onde a figura quase heróica do coronel mistura o poder econômico da fazenda de engenho, com o poder político de prefeito da cidade, concentrada na mesma pessoa: Coronel José Paulino. Estes fatores e muitas das características citadas no romance estão presentes na história da sociedade brasileira da época da escravidão, principalmente da região nordestina.



CRENDICES POPULARES – O livro faz referências a crendices populares, como a do lobisomem, que é citada através de João Cutia, um comprador de ovos da Paraíba. “Não tinha uma gota de sangue na cara e andava sempre de noite, para melhor fazer as suas caminhadas, sem sol”. Achava-se que ele era lobisomem.

“O lobisomem é outro mito presente no imaginário nordestino. Vinda da Europa, onde o mito do ser humano que vira lobo é conhecido desde a Grécia Antiga, onde Liacon, por Ter atacado Zeus, foi transformado num desses animais – esse mito, que por sinal existe no resto do Brasil, no Nordeste é explicado de várias formas. Uma delas é que quando um casal tem sete filho homens, se não der o último para ser batizado pelo mais velho, ele vira lobisomem. Irmão que tem relações sexuais com a irmã, se tiver filho, ele será lobisomem. Também filho de relação sexual entre compadre e comadre tem tudo para se um “lobo-homem”.


Dizem que são nas noites de quinta para sexta-feira, principalmente se for noite de lua cheia, que a pessoa se transforma. Para haver o desencantamento há várias maneiras: deve-se tirar sangue dele, mas sem se sujar, pois se isso acontecer vira-se lobisomem também. Quando ele aparecer, deve-se fazer o sinal da cruz diante dele que ele corre. Ou, então, rezar três ave-marias.


Já para matar o lobisomem um jeito é usar bala besuntada com cera benta de vela de igreja”. ( O Grande livro do folclore ).
Quando José Gonçalo, um negro que trabalhava no engenho de José Paulino, é morto por Mané Silvino, aparece o lendário do engenho mal-assombrado, o qual no Nordeste ocorre à meia-noite, no meio do silêncio, quando o engenho começa a funcionar sozinho. Dizem que esta noite assombrada, só pode ser presenciada por aqueles que têm amor aos tempos que não voltam mais.

José Paulino também fazia remédios – uma crença nos medicamento naturais – ele tratava de tudo, fazia sinapismos de mostarda, dava banhos quentes, óleo de rícino, jacaratiá para vermes. Curava assim os negros, os netos, os trabalhadores e lancetava furúnculos.